O Mal Nosso de Cada Dia (Donald Ray Pollock)
❧ Donald Ray Pollock
❧ 304 páginas
❧ Editora DarkSide Books
❧ Tradução de Paulo Raviere
❧ 5★
Um livro indigesto
Existem aqueles livros que você lê porque viu o filme e gostou, existem aqueles filmes que você leu o livro e quer ver como adaptaram para o audiovisual, e para mim existe o caso de O Mal Nosso de Cada Dia. Quando eu vejo que a Netflix lançou um filme que tem no elenco dois dos meus atores favoritos (Tom Holland e Robert Pattinson), ainda com a participação do Bill Skarsgård, eu tenho no meu coração que é um filme mais do que necessário que eu assista. Mas quando é um filme baseado num livro, vai ter que acontecer aquela espera de ler o livro primeiro. Sendo assim, o motivo principal de eu comprar e ler O Mal Nosso de Cada Dia era pra ver um filme que eu nem sabia sobre o que se tratava, uma espera que levou pelo menos uns dois anos, complexo, eu sei, mas foi assim.
Em dezembro de 2023 comecei a dar uma desacelerada nas minhas leituras, até que elas simplesmente pararam por três semanas e eu não conseguia mais abrir um livro. Toda vez que eu pegava algum ebook no Edward (esse é o nome do meu Kindle) ou abria algum dos físicos que estão encalhados aqui em casa desde que comprei me subia um desconforto e eu não conseguia começar a leitura de jeito nenhum. Até que dei uma chance para Revan, um romance de Star Wars que se passa na época da Velha República, milênios antes de A Ameaça Fantasma, mas não é ele o foco dessa resenha. Enfim, demorei uns dias pra terminar Revan e com aquele ânimo de enfim ter conseguido terminar um livro de novo já peguei logo um outro que estava na minha estante há um tempo, O Mal Nosso de Cada Dia, e, meus amores, eu devorei.
Um livro sem sinopse
Quando eu terminei o prólogo do livro de Pollock fui olhar a capa de trás para conferir a sinopse, afinal naquela altura eu ainda nem tinha parado para ver sobre o que se tratava o livro, e o texto atrás não revelava muita coisa, somente que a história iria girar em torno de um garoto/homem que estaria cercado de personagens um tanto quanto perigosos. A questão é que, mesmo agora após ter terminado a leitura desse livro, eu não consigo dizer qual é a sinopse sem revelar muito sobre o que é a história.
Entretanto, posso dizer o seguinte: existe um rol de personagens distantes entre si, a maioria não tem relação consanguínea, e a história das vidas deles irão se entrelaçar num intricado nó que se encontra na pequena cidade de Knockemstiff, Ohio. A narração é feita em terceira pessoa, mas não é aquele narrador imparcial e distante que a gente encontra na maioria das histórias, pelo contrário, é um narrador quase que personagem. Ele toma as dores do personagem ao qual está dando foco no momento, ele imita a maneira de falar, ele xinga como o personagem fala, é um narrador que me lembrou muito os presentes nos livros do Stephen King. Inclusive, essa livro me deu muito a sensação de que estava lendo uma obra do King, cidade pequena, clima sombrio, personagens imperfeitos e desajustados, múltiplos focos.
Podemos considerar como protagonista, mesmo não aparecendo o tempo todo no romance, o jovem Arvin Russell, um personagem que o leitor acompanha desde a sua muito complicada infância até o momento em que termina o ensino médio. Além de Arvin, o leitor encontrará ainda a história de vida de outros personagens, como o reverendo Preston Teagardin, o xerife Lee Bodecker e a dupla de pregadores Roy e Theodore. Entretanto, os personagens mais importantes ao lado de Arvin, e que o leitor acompanhará por um bom tempo durante a narrativa, é o casal de serial killers Carl e Sandy. Se eu começar a falar sobre a história desses personagens vou acabar contando a história toda do livro, como eu disse, é um livro sem sinopse. O Mal Nosso de Cada Dia é um tipo de narrativa que raramente encontrei na minha vida de leitor: uma narrativa tecida de uma maneira tão bem trabalhada e intrincada que a única maneira possível de se recomendar para outra pessoa é dizer “leia”, e nada além disso.
Uma senhora experiência
Como não posso falar muito sobre a história, meu relato de experiência com esse livro terá que ser bem breve, mas é importante que um aviso seja feito: esse não é um livro de fácil digestão. Acontecem cenas muito pesadas envolvendo suicídio, assassinatos, entre outros assuntos bem complicados, que chocaram até a mim. Enquanto eu lia, o que durou dois dias (realmente é um livro que você devora, mesmo com os parágrafos de narração sendo a maior parte do livro e longos), só conseguia me perguntar: como eles adaptaram essas cenas tão pesadas para o filme? Bom, eles adaptaram.
Assisti ao filme no mesmo dia que terminei de ler o livro e infelizmente não foi tão bom quanto eu esperava. Já começa pelo fato do filme ter um narrador, e ok, era necessário levando em conta a história e tal, mas ainda assim é muito estranho um cara contando essa história da maneira como foi feita no filme. Em questão de mudanças na história, pouquíssima coisa foi alterada, somente a ordem de algum acontecimento aqui e ali, mas num todo parece um copia e cola do papel pra tela, o que não me agrada muito porque tira aquela surpresa do que pode ou não acontecer no resto da história. As atuação me pareceram meio estranhas, o Tom Holland ainda me parece que não saiu (pelo menos naquele momento, lembrando que o filme já tem alguns anos) do papel de Peter Parker do MCU e o Pattinson ou estava atuando muito bem e passou para a câmera a mesma sensação do seu personagem, de que ele não queria estar ali, ou o ator realmente estava fazendo aquele filme para pagar alguma conta. Entretanto, o maior problema do filme para mim é ele não ter clima, não ter alma. Essa é uma história que se passa entre as décadas de 1940 e 1960, no sudoeste dos Estados Unidos, uma região bem “caipira”, rural, mas o filme não me passava essa sensação, seja pela fotografia ou pela direção. Em resumo, é um filme que me pareceu mediano, não é uma coisa mal feita, mas que se percebe a falta de alma dentro da produção, o que é uma pena já que o livro é completamente imersivo e climático em todos os momentos.
Para me despedir dessa resenha, reforço o que falei acima: esse não é um livro para qualquer um. No entanto, ainda é um livro incrível e que me deixa triste o fato de eu não poder ter mais uma vez a experiência e sensação que tive quando estava lendo ele. Não é bem uma história com uma mensagem ou lição, mas é um livro que te faz sentir coisas, que pode te deixar desconfortável, mas também te trazer algum conforto excêntrico. Queria muito que a DarkSide trouxesse o outro livro do autor, Knockemstiff, que é uma coletânea de contos que se passam nessa cidadezinha, mas acredito que seja bem difícil que a editora ainda traga algum dia.




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