A Ilha sob o Mar (Isabel Allende)
Eu vou pra Louisiana com meus sofrimentos para cantar…
No ano passado, durante a Black Friday, eu comprei o box da Isabel Allende que vem com A Casa dos Espíritos, Filha da Fortuna e A Ilha sob o Mar, algumas das suas maiores e mais famosas obras. Demorei quase um ano, mas enfim consegui terminar de ler os três romances e nessa resenha venho falar do último deles, A Ilha sob o Mar, publicado pela primeira vez no ano de 2009.
Mais uma vez, romance histórico…
Assim como os outros dois livros anteriores que li de Allende, A Ilha sob o Mar é um romance que narra um período histórico, mas acho que nesse livro a autora mostra que ela não é uma escritora somente disso. Isabel tem um poder com as palavras que consegue cativar o leitor, mesmo que a sua escrita não seja tão fluida assim, como falei na resenha de Filha da Fortuna, seu livro não é só um romance sobre um período histórico pois vai muito além disso. Ela aborda a situação das mulheres em diversos momentos da história da humanidade, sem tornar repetitivo caso o leitor pegue várias livros dela para ler em seguida, além de criar uma narrativa dramática que surpreende o leitor em diversos momentos.
A Ilha sob o Mar conta a história de Zarité, uma escrava haitiana que será vendida para um fazendeiro francês que se mudou para Saint Domingue (o nome da ilha antes de ser Haiti) para lidar com as posses do pai que estava morrendo, na segunda metade do século XVIII e início do século XIX. Primeiramente, a história começa com Toulose Valmorain, esse francês que eu já falei anteriormente, que deixou a corte francesa que na época estava começando a entrar em crise; em Saint Domingue ele vai construindo seu domínio (mas não de forma fixa pois ele acreditava que logo voltaria para Paris) e lá conhece Violette Boisier, uma cortesã filha de mãe negra e pai branco, e, após deixarem de lado a relação de cliente/fornecedora de serviços, se tornam amigos. Um ponto desse livro que deve ser deixado claro é que todos os personagens são importantes em algum momento e todos estão interligados de alguma forma com Zarité, portanto, não pense que o tempo que a autora leva para contar histórias paralelas de personagens secundários é enrolação pois é necessário que essas subnarrativas sejam contadas para que a história ande e se desenrole ao longo dos anos.
Em uma viagem para Cuba, Toulose conhece Eugenia del Solar e, antes dela chegar em Saint Domingue, ele pede para que Violette decore e mobílie a sua casa, além de arranjar novos escravos domésticos. É aqui que entra Zarité, ainda com nove anos, que é comprada e dada a Eugenia como criada pessoal; a partir daqui o leitor irá acompanhar toda a jornada de vida de Teté, como ela é chamada, até os seus quarenta anos. Passando por três períodos de gestação, um onde o seu bebê é tirado dela mesma e dado a Violette, fuga da fazenda para o estado da Louisiana, nos Estados Unidos, e algumas revoluções em Saint Domingue, Zarité é uma heroína, é uma protagonista cativante que me conquistou do início ao fim.
Como eu já disse anteriormente, a corte francesa durante a época do romance começa a entrar em crise e isso vai culminar na Revolução Francesa, até mesmo há uma cena em que a execução de Luís XVI é anunciada em um jantar onde boa parte da burguesia de Saint Domingue estava reunida. Assim como eu disse na resenha de Filha da Fortuna, acontecimentos e realidades históricas não estão isoladas, uma coisa afeta a outra e algo tão grande como a Revolução Francesa não iria afetar somente a França, ainda mais com ela tendo tantas colônias, como a própria Saint Domingue. Os ideais da Revolução, liberdade, igualdade e fraternidade, são utilizados pelos escravos africanos da ilha e pelos mestiços que, por não terem os dois pais brancos, são considerados inferiores, e assim se tornam também os ideais dessas duas classes sociais que começam a Revolução Haitiana, um processo de independência que durou desde 1791 até 1804 e resultou na criação da República do Haiti. Quando a história passa a se situar na Louisiana, a autora não deixa de lado o fator histórico do seu romance e dá uma aula de história contando como o estado passou do controle francês para o espanhol, voltou para o francês e terminou sendo agregado aos Estados Unidos. É um livro complexo que aborda diversos contextos históricos interligados enquanto conta uma história trágica de resistência e sofrimento, mas também de busca e luta pela liberdade e felicidade.
Alternando entre capítulos narrados em terceira pessoa e capítulos contados pela própria Zarité onde ela mostra ao leitor seus ensinamentos e aprendizados, os capítulos curtos deixam a narrativa mais dinâmica, não sendo um livro maçante de ler e que instiga o leitor a continuar lendo quando a autora deixa em rápidas passagens pequenos spoilers do que irá acontecer a seguir. Dos três livros, esse foi o que mais conquistou pela protagonista, histórias com protagonistas negras e que lidam com a difícil realidade do sul dos Estados Unidos sempre me interessam mais, não à toa alguns dos meus livros favoritos são A Cor Púrpura e Seus Olhos Viam Deus. São histórias de resistência com protagonistas lutadoras, protagonistas cativantes que nunca deixam a minha mente e me acompanharão ao longo da minha vida, e com A Ilha sob o Mar não foi diferente. Allende mostra em diversos momentos sua opinião contra o racismo e a escravidão, além da sua batalha pela igualdade de direitos entre mulheres e homens, tudo isso em conjunto com uma história incrível e que é impossível não conquistar o leitor. Leia, simplesmente leia A Ilha sob o Mar, um livro incrível e que te garanto que vale a pena cada página.
❧ A Ilha sob o Mar (publicado originalmente em 2009)
❧ Isabel Allende
❧ 528 páginas
❧ Editora Bertrand Brasil
❧ Tradução de Ernani Ssó
❧ 5★



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